terça-feira, 7 de julho de 2015

As Flores de Meu Caderno

"Eu rabisco o sol que a chuva apagou". A frase é de autoria de Renato Russo, Villa-Lobos e Bonfá, compositores da música Giz, interpretada pela banda Legião Urbana. O sol não está ali, é apenas o traço de um giz que está ali. Ceci n'est pas une pipe. Ok. Embora a chuva seja do “plano real”, o sol não deixa de ser real, na amplitude do conceito de real, por ser um rabisco. Quem sabe o sol que se faz do próprio sol seja um sol muito melhor do que o sol que sabia ser sol apenas sem a chuva? Cria-se sóis.


Eu rabisco flores no meu caderno. As flores de meu caderno são sempre da mesma cor da caneta que estou usando para escrever. Geralmente tenho a azul, a vermelha e a preta na minha mochila. Mas a explicação para eu não usar a caneta vermelha, por exemplo, para enfeitar as pétalas de uma rosa é simples: não são desenhos planejados. Os rabiscos são como anotações extras do conteúdo que está sendo aprendido. A minha letra é um rabisco. As flores são rabiscos extras.
 Agora, o porquê de flores? Bom, primeiro porque se a professora chegar a olhar meu caderno (espera-se que uma professora universitária não procure olhar cadernos a fim de saber se o conteúdo foi copiado pelos alunos, como ocorre no ensino fundamental. Mas professores universitários gostam de andar enquanto falam... E alguns andam por entre as classes, com o fim de admirar desenhos alheios em cadernos alheios) não quero que se depare com uma caricatura sua ou mil coraçõezinhos infantis sobre o papel. Pode se achar um desenho de flor tão infantil quanto o de coraçõezinhos. Pensando bem, qualquer desenho em um caderno usado no contexto de ensino superior não é lá algo muito acadêmico. Nem para o pessoal do Design ou das Artes Plásticas. Eles têm conteúdos e tarefas. Sobre os conteúdos, escrevem. Sobre as tarefas, desenham. A tal da aprendizagem formal...

 Enfim, outro motivo do porquê das flores é que flores têm miolo, pétalas, cabo, espinhos, folhas e ramificações. Assim, variam! E esta diversidade enfeita e preenche bem qualquer espaço. Ademais, é variado também sua elaboração e contexto em que são rabiscadas.


Flores isoladas: conteúdos prontos, pragmáticos. Nesta categoria ou a aula está chata e permito-me ater-me aos detalhes do miolo, pétalas, cabo... Ou o assunto envolve dados históricos e conceitos os quais vou precisar decorar e pronto.

Flores emaranhadas: conteúdos difíceis ou empolgação com a aula. Não atenho-me ao cuidado com os detalhes pequenos, o traço não apresenta proporcionalidade entre os elementos.









Estas duas principais categorias de flores permitem-me recordar o que eu estava sentindo em relação a aula. É sabido que memórias que envolvem emoção são mais fáceis de serem armazenadas e posteriormente lembradas. Ou seja, identificando as emoções, fixo e aprendo mais conteúdos. Contudo, esta estratégia não é intencional. Assim como acredito que o sol que Renato e seus amigos insistem em desenhar não tenha a proposição de ocupar o lugar do sol propriamente dito. Se há conexão ou não entre meu aprendizado e as flores? Não sei. Há conexões nas ditas desconexões tanto quanto há sóis num céu. Fluir o pensamento, divagar, lidar com os próprios recursos, associar dever com o gosto... Como diz o ditado: “Tudo vale a pena se a nota da prova não for pequena”.