quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Doce no Céu

Wassily Kandinsky, o pioneiro do abstracionismo, certa vez informou: "Não há nenhum dever na arte porque a arte é livre". Assim, desapropriando-se da figura, criou uma nova forma de compor suas obras. E eu não sabia nada disso em abril de 2010.
Wassily Kandinsky, "Bleu de Ciel", 1940
Wassily Kandinsky, "Around the Circle", 1940

Quando a minha sobrinha nasceu, as horas no hospital passaram como décadas. Foi estranha a maneira como o tédio e a ansiedade ocuparam o mesmo espaço naquela tarde. Qualquer período é tempo demais para matar a saudade de quem se ama e nem se conhece ainda.
Na parede da sala de espera havia uns dois ou três quadros de Kandinsky. Antes de me levantar para ler as explicações sobre o artista debaixo da gravura, fiquei admirada com o que vi. Ou melhor, com o que parecia ver. Não há nada de concreto, sólido ou já estabelecido no sentido da palavra abstração. É aí que entra não só a intenção do artista mas a falta de imparcialidade do observador. Bebê lembra coisas fofas: travesseiros fofos, unicórnios, filhotes de panda, sorriso de criança... Deste modo, pensando na minha pequena sobrinha, o lugar transformou-se em uma ótima galeria de arte disfarçada de hospital(que não tem as paredes brancas por um acaso, eu aposto!). Coisas de Kandinsky: formas soltas e interligadas num fundo colorido, formas geométricas ou inventadas e um pouco de muita leveza. Nuvens de algodão doce foram sendo descobertas, balas de coco e trens suspensos no céu. Tudo naqueles quadrados em minha frente.
"Algodão Doce", fotografia de Catherine Ferraz

A meninice brincou nos meus olhos mais uma vez e exclamei: Kand-in-sky!

Candy in sky = doce no céu.

"Toda forma, toda cor, significa um sentimento: não existe nada no mundo que não diga nada". Wassily Kandinsky.